segunda-feira, 5 de setembro de 2011
Compreensão das nuvens pode originar novos modelos climáticos
(Ciência Hoje - Portugal) O estudo da formação das nuvens, através da compreensão do efeito dos raios cósmicos sobre a constituição de aerossóis atmosféricos, pode dar a conhecer a evolução da qualidade do ar e do próprio clima, ajudando assim, de forma indirecta, a compreender as alterações climáticas.
Este é pelo menos o objectivo da experiência CLOUD, levada a cabo no CERN (laboratório europeu de estudo da Física de partículas) e realizada por cientistas de diversas instituições, entre as quais o Departamento de Física da Universidade da Beira Interior (UBI) e o Laboratório de Sistemas, Instrumentação e Modelação em Ciências e Tecnologias do Ambiente e do Espaço da Universidade de Lisboa (UL).
Embora o projecto esteja ainda numa fase embrionária, os primeiros resultados foram já publicados na revista “Nature” e mostraram que “os raios cósmicos têm uma importância muito superior ao que se pensava” na formação de aerossóis atmosféricos, referiu António Tomé, docente do Departamento de Física da UBI e um dos membros da equipa portuguesa.
O investigador explicou ao “Ciência Hoje” que este projecto estuda “a formação de partículas de aerossóis – as sementes para a formação das nuvens”. Assim sendo, há uma relação “indirecta” do projecto “CLOUD” às alterações climáticas. Apesar de não permitir “fazer cenários climáticos, o estudo e maior conhecimento de um fenómeno físico que é uma parcela muito mal conhecida permitirá melhorar os modelos climáticos hoje existentes”.
António Tomé destacou que o sistema climático não é “linear” e que mesmo que se conclua que o efeito dos raios cósmicos é gigantesco, “esse efeito, colocado perante um modelo climático, pode ter no final um sinal contrário ou ser bastante reduzido”. Trata-se da mesma situação do dióxido de carbono. “Ninguém duvida que a concentração deste composto faz variar a temperatura, mas esse não é o seu único efeito”, exemplificou o investigador.
Vem daí a relação indirecta com a questão das alterações climáticas. “Em consonância com outras áreas de conhecimento, o estudo será efectivamente mais um salto científico na obtenção de cenários climáticos”, disse, acrescentando que “pode mostrar o quão fidedignos são os que já existem”. As medições precisas resultantes da experiência CLOUD são importantes para alcançar um entendimento quantitativo da formação de nuvens, algo que contribuirá para uma melhor avaliação dos efeitos das nuvens nos modelos climáticos.
Raios cósmicos melhoram formação de aerossóis
De acordo com Jasper Kirkby, responsável pela experiência, “descobriu-se que os raios cósmicos melhoram significativamente a formação de partículas de aerossóis na troposfera média e superior. Estes aerossóis podem eventualmente crescer para sementes de nuvens”.
Além disso, constataram que os vapores que se pensavam explicarem a totalidade de formação de aerossóis na baixa atmosfera , fazem-no apenas numa pequena fracção do observado - mesmo com o aumento associado ao efeito dos raios cósmicos.
Desempenho português
A equipa portuguesa implementou e actualiza continuamente o sistema de aquisição e armazenamento de dados e tem uma participação muito activa no desenvolvimento do sistema de iluminação de ultra violeta.
“São cerca de dez elementos, com especialistas em astronomias, alterações climáticas, aerossóis ou instrumentação. É uma equipa interdisciplinar que contribuiu para a integração de todos os aparelhos do CLOUD, que se ocupa dos sistemas de controlo e da monitorização. Além disso, temos pessoas na análise de dados”, disse António Tomé.
Embora o grupo, na actualidade, se dedique mais à instrumentação, o investigador da UBI sublinhou que não se vai ficar por essa área. “Queremos ainda participar activamente nas implicações deste trabalho para os cenários climáticos e contribuir mais para o desenvolvimento de instrumentação óptica”, acrescentou.
Experiência CLOUD
A experiência CLOUD consiste numa câmara em que as condições atmosféricas podem ser simuladas com elevado rigor e precisão. Isto permite estudar o mecanismo de criação de partículas que servem de núcleos de condensação, o efeito dos raios cósmicos e da radiação ultravioleta e saber quais os gases responsáveis pelos mecanismos de formação de nuvens.
“É uma câmara onde conseguimos uma pureza imensa e podemos levar a tecnologia ao limite, pois está longe da contaminação. De forma muito controlada, permite-nos ver o que se passa no início da formação de nuvens”, frisou António Tomé.
O físico português lembrou que, anteriormente, este tipo de projectos era “muito difícil”, na medida em que a contaminação dos espaços onde eram feitas as experiências “não permitiam ter resultados fidedignos”.
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